terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Dublê de Corpo

• título original:Body Double
• gênero:Drama/Suspense
• duração:114 minutos
• ano de lançamento:1984
• direção:Brian de Palma
• roteiro:Brian de Palma
elenco:
• Craig Wasson (Jack Scully)
• Melanie Griffith (Holly Body)
• Gregg Henry (Sam Bouchard)
• Deborah Shelton (Gloria Revelle)
• Guy Boyd (detetive Jim McLean)
• Dennis Franz (Rubin)
• David Haskell (Will)
• Rebecca Stanley (Kimberly Hess)
• As Israel (Corso)
• Steven Bauer (diretor assistente de fime)
Nota: 6,7 (categoria/parâmetro: suspense)

Colcha de retalhos de duas grandes obras do mestre do suspense Alfred Hitchcock, Um Corpo que Cai e Janela Indiscreta, “Dublê de Corpo” consegue ser um bom filme, mesmo ficando às margens de seus grandes inspiradores.
Aqui Brian de Palma como sempre exibe suas habilidades de câmera e muito sangue, além de articular uma minuciosa trama com um final imprevisível digno de um bom suspense (apesar de, sob certas perspectivas, ser um tanto forçado).
O peculiar no filme foi que o que foi de imediato julgado falha, inverossímil ou lugar-comum mostrou-se, com o desenvolver da história, detalhes cruciais e justificativas para que a reviravolta da trama ocorresse. Alguns exemplos:
- que mulher em sã consciência faz uma dança erótica e se masturba na sala de sua casa com as persianas abertas todo santo dia pontualmente no mesmo horário (“como um reloginho”, como diz Sam Bouchard, interpretado por Gregg Henry)? O que parece num primeiro momento pretexto inverossímil e absurdo para que Jack (Craig Wasson) tivesse alguma gostosa que pudesse espiar de sua janela (dando ao filme um toque erótico que lhe garantisse maior público) e por quem pudesse se apaixonar depois (dando ao filme um toque romântico que lhe garantisse ainda maior público), num segundo momento mostrou-se parte de uma conspiração inesperada e eixo principal do suspense. Ponto positivo.
- o vilão terrivelmente feio apresentado no início da história deu a entender que se tratava de mais um “embate” entre o “bem” belo e charmoso e o mal, que, além de mal, é feio. Ou seja, eco de um mecanismo usado desde os contos de fada da Disney até muitas comédias românticas atuais que serve para, associando maldade com feiúra, enfatizar a necessidade e a virtude de se estar encaixado dentro dos padrões convencionais de beleza vinculados pela mídia e pela exportação norte-americana. Mas, apesar de sabermos que uma máscara tão feia era em suma desnecessária, o fato é que era apenas uma máscara, tratando-se o vilão de uma pessoa normal, e mais do que normal: não uma síntese de toda a maldade do mundo, mas apenas um ser humano interesseiro e manipulador. Ponto positivo.
Além disso, há aquela cena porca da perseguição (Jack perseguindo sua “musa da dança erótica”, Gloria Revelle, interpretada por Deborah Shelton, em prol de protegê-la do “homem feio suspeito” que também a persegue). Jack é tão terrivelmente indiscreto que ficamos indignados durante toda a cena, pensando “caramba, que mulher lerda! Como ela não viu o cara ainda?” Mas, conforme ela afirma depois, ela o vira sim. Não é exatamente um indulto: primeiro porque, mesmo assim, Brian de Palma, com toda sua técnica, poderia ter realizado uma perseguição mais plausível, segundo porque, se ela o vira e estava com medo, era natural que parasse de andar por aí e fosse para algum lugar seguro. Contudo, também não é o fiasco que ameaçou ser. Vá lá, ponto positivo.

Agora, resta supor se essas aparentes falhas de enredo que depois se justificam são de fato perdoáveis ou se são frutos de uma incapacidade do roteirista (o próprio Brian de Palma) de elaborar uma trama de suspense que se mostre verossímil sob ambas as perspectivas possíveis: a aparente, que acreditamos ser verdade durante o decorrer do suspense, e a verdadeira, que descobrimos numa reviravolta ao final da trama. A história como é mostrada só se mostra possível nesta última perspectiva. Ou seja, não é perfeito, mas também não é o fiasco que ameaçou ser.
Agora, fiasco mesmo é a cena em que, totalmente do nada, Jack beija Gloria Revelle, e esta se comporta feito uma atriz pornô no cio. Clichê absolutamente ridículo que, além de fácil atrativo de audiência, de tirar “oh” e “ah” exasperados e ingênuos do publico, serve também de pretexto para de Palma exibir seus dotes circulando a câmera em torno do casal, este que só falta transar lá na praia mesmo. Perder muito tempo aqui com as condenações de sempre é desnecessário.
O último ponto em que o filme deixa um pouco a desejar, embora não seja lá um absurdo, é a coincidência de Jack ter decidido assistir um filme pornô e ter se deparado justamente com a atriz que servira de dublê de corpo a Gloria. Sem esta “pequena” coincidência, a verdadeira trama jamais seria descoberta. Difícil de acontecer, mas não impossível. Dá-se um desconto.
A última cena de “Dublê de Corpo”, depois de concluída toda a trama do suspense, é uma tirada perfeita. Reaceito para as filmagens das quais fora expulso, Jack, atuando como uma espécie de vampiro tarado, tem que se imobilizar para esperar que a produção do filme troque a atriz com que está contracenando pela dublê de corpo. Após a dublê de corpo da vida real, a dublê de corpo do filme – e uma descompromissada denúncia de como as atrizes belas e gostosas do cinema conseguem estar sempre belas e gostosas no cinema. Enquanto isso, passam-se os letreiros com a ficha técnica. Não há muito esclarecimento sobre como Holly Body (Melanie Griffith), após praticamente quase mandar Jack prum manicômio, foi parar nessa cena. Fora isso, uma sequencia final criativa e apropriada.

- Paralelos com Hitchcock

Os paralelos de Brian de Palma com obras clássicas do cinema ficam entre a mera inspiração, a dedicada homenagem, e a desnaturada cópia.
Jack Scully é um personagem limitado pela sua fobia, assim como o policial Scottie (James Stewart) de “Um Corpo que Cai”. Este tem acrofobia (medo de altura), enquanto aquele tem claustrofobia (medo de lugares fechados). Contudo, não obstante várias semelhanças, o argumento principal se distancia: a obra de Hitchcock explora como os nossos medos e traumas podem ser usados em prol dos interesses de outras pessoas; Brian de Palma, com intenções bem menos pretensiosas, passa longe disso. A fobia de Jack é apenas algo a ser superado, cuja superação lhe garantirá uma investida previsível contra o inimigo que o oprime, virando o jogo, além de lhe permitir retornar às filmagens. Talvez uma inspiração, quiçá uma homenagem a um ídolo: não chega a ser uma cópia.
Bem mais próximo talvez esteja o filme do argumento de “Janela Indiscreta”, em que L. B. Jefferis, o personagem de James Stewart se envolve numa conspiração devido à sua atitude de espiar os vizinhos pela janela (igualzinho a “Dublê do Corpo”). Contudo, também nesse caso o que se vê é uma boa piorada no uso que se faz do argumento, também devido às intenções pouco pretensiosas de Brain de Palma. Jeff espia pessoas comuns em seus cotidianos, em uma espécie de “curiosidade” mais do que pela vida alheia, mas pelo comportamento humano. Jack espia uma típica gostosa dançando e se masturbando na janela.


Prêmios:

Brian de Palma Rrcebeu 5 indicações ao Framboesa de Ouro de Pior Diretor, por seu trabalho em "Vestida Para Matar" (1980), "Scarface" (1983), "Dublê de Corpo" (1984) "A Fogueira das Vaidades" (1990) e "Missão Marte" (2000).

Nenhum comentário:

Postar um comentário