sábado, 27 de fevereiro de 2010

A Partilha


• título original:A Partilha
• gênero:Comédia
• duração:01 hs 33 min
• ano de lançamento:2001
• estúdio:Globo Filmes / Columbia TriStar do Brasil / Lereby Produções
• distribuidora:Columbia TriStar do Brasl
• direção: Daniel Filho
• roteiro:Miguel Falabella, Daniel Filho, João Emanuel Carneiro e Mark Haskell Smith, baseado em peça teatral de Miguel Falabella
• produção:Daniel Filho
• música:Nelson Motta e Ed Motta
• fotografia:Felix Monti
• direção de arte:Marcos Flaksman
• figurino:Marília Carneiro
• edição:Felipe Lacerda
elenco:
• Andréa Beltrão (Regina)
• Glória Pires (Selma)
• Paloma Duarte (Laura)
• Lília Cabral (Lúcia)
• Herson Capri (Luiz Fernando)
• Dênis Carvalho (Carlos)
• Marcello Antony (Bruno Diegues)
• Chica Xavier (Bá Toinha)
• Fernanda Rodrigues (Simone)
• Guta Stresser (Célia)
• Cininha de Paula (Fiscal da alfândega)
• Lui Mendes (Tonelada)
• Thiago Fragoso (Maurício)
• Laís Clara (Lúcia - criança)
• Luane Silva (Selma - criança)
• Taissa Pereira (Regina - criança)
• Manoela Rodrigues (Laura - bebê)
• Vinícius Marques (Pai)
• Christina Xavier (Bá Toinha - jovem)
• Maitê Proença
• Miguel Falabella
• Tony Ramos
Nota: 7,3 (parâmetro/categoria: comédia de costumes)

- O diretor e o roteirsta
Considero A Partilha um filme importante porque salva dois nomes das artes visuais brasileiros que geralmente são associados a produções comerciais: Miguel Falabella e Daniel Filho. Aquele não se trata de um dramaturgo superficial apenas por dar um tratamento leve aos dramas familiares das famílias de classe média. Este, por sua vez, apesar de ser pouco artista o suficiente para afirmar que a virtude essencial de um filme é comunicar, é perfeitamente capaz de dirigir coisa com muito mais conteúdo do que Se Eu Fosse Você (1 e 2, porque toda porcaria tem continuação).
De fato, devemos ao diretor não somente essa magistral cópia de filme norte-americano de Sessão da Tarde, mas também a destruição inveterada e impiedosa de uma das mais renomadas obras da literatura portuguesa, O Primo Basílio, cuja adaptação para o cinema lhe reduziu a pornochanchada. Mas quando, em 2009, nos deparamos de repente com um filme tão comovente e peculiar como Tempos de Paz, conscientes de que o diretor da obra-prima é Daniel Filho, somos condicionados a nos lembrar da pérola do humor negro que foi Muito Gelo e Dois Dedos d’Água, de 2006. E a lembrar de A Partilha.
A Partilha é adaptação de uma peça de Falabella – que também assina o roteiro – personalidade associada a séries estritamente comerciais – embora engraçadas – da tv Globo, como Sai de Baixo e – o não tão engraçado assim – Toma Lá, Dá Cá. Porém, na área da dramaturgia, ele é uma espécie de Nelson Rodrigues otimista e caricato.
Caricato; não superficial – como demonstrou em ambos os filmes que roteirizou: A Partilha e Polaróides Urbanas (o qual também dirige), ambos de muita qualidade e que apresentam até um toque psicanalítico.

-A verdadeira partilha
A Partilha conta a história de quatro irmãs que levam vidas totalmente separadas e distintas – Glória Pires é por conformismo casada com um militar que transforma a casa num quartel, e tem uma filha “alternativa” que fica grávida de um tipo de índio; Paloma Duarte (a filha mais nova, motivo pelo qual é amargurada de não ter podido se inserir no grupo das irmãs quando criança) é uma intelectual homossexual que está mergulhada em sua tese e almeja viajar para a Europa para terminá-la, enfrentando conflitos com a namorada (Guta Stresser) que não quer acompanhá-la; Andréa Beltrão é separada do marido com quem casara por exigência dos pais e que a incomodava com taras sexuais incomuns, tipo urinar nela, e que não tem sorte no amor; Lília Cabral (a filha mais velha) vive na França e tem uma relação péssima com seu filho, que a odeia por tê-lo “abandonado” para ir viver no estrangeiro com o homem por quem se apaixonara –, mas têm que unir-se para fazer a partilha dos bens da mãe que acaba de falecer.
O enredo facilmente poderia cair no clichê dos filhos interesseiros e totalmente despudorados (de personalidade unilateral) que se matam para sair melhor do que o outro na divisão da herança, mas que no final se arrependem e etc etc etc. Não é nada disso. Ao final percebemos que a partilha a que o título se refere não é a partilha dos bens, mas a partilha de experiências de vida, de risos, de brigas, de afetos, ódios, fraquezas. Partilha que as quatro irmãs só tiveram a oportunidade de fazer por terem se unido em função da outra partilha – que de modo algum é tratado com ingenuidade, pois há sim interesses por partes das irmãs. Só que elas são humanas além do interesse. Não se pode chegar a dizer que são complexas, pois é uma comédia de costumes e não uma se trata de uma obra tão pretensiosa; mas também não são personagens rasos, elas são ambíguas e muitas vezes confusas quanto ao que querem.
Selma, por exemplo (personagem de Glória Pires) fica o filme todo aumentando o preço do apartamento de sua mãe porque, no íntimo, não quer que ninguém aceite comprá-lo: ela não quer se desamarrar de suas lembranças. Ao mesmo tempo, vive o conflito de trair o marido com o agente imobiliário – que, antes de ser agente, é um pintor surrealista – ou manter-se no conformismo. Por ser uma comédia despretensiosa, esse conflito tem final ingênuo, com Selma como que reapaixonando-se pelo marido (e ficamos até com a esperança de que ele abdique de seu costume metódico de etiquetar os objetos da casa; costume esse, aliás, que rende uma cena engraçada e irônica em que uma Selma bêbada etiqueta as coisas erradas, penteando-se com o sabonete e olhando-se na parede escrita “espelho”).
Por ser uma comédia despretensiosa, não há um sentimentalismo em torno de temas tão delicados. Exceto na cena final totalmente dispensável, em que as quatro irmãs narram em off o destino que elas levaram (destinos que o espectador já tinha deduzido sozinho e que não precisariam ser assim mastigados), enquanto uma Glória Pires chorosa assiste filmagens de quando as quatro eram crianças, tudo com uma trilha sonora sentimental típica. Seria um filme mais maduro, sim, se terminasse logo antes de aparecer “3 meses depois” na tela.
Assim, temos um filme com um final ingênuo e típico do gênero, mas com um desenrolar de enredo que escapa dos padrões convencionais esperados; embora mesmo assim consiga certo apelo comercial, isso não o impede de ter conteúdo. Alterando momentos engraçados e tristes, mas sempre com bastante leveza e certa sensibilidade, o filme retrata vários conflitos da classe média sem apelar para estereótipos ou julgamentos fáceis (embora, ao contrário, em alguns momentos seja um pouquinho condescendente). E a partilha recíproca desses conflitos mostrará que ninguém é melhor do que ninguém: seres humanos têm interesses e fraquezas, e sentimentos dúbios, mas é tudo isso que garante que sejam humanos.



Prêmios:

Grande Prêmio BR de Cinema 2002 (Brasil)
Recebeu duas indicações na categoria de melhor atriz, para Andréa Beltrão e Glória Pires.

Festival de Cinema Brasileiro de Miami 2002 (EUA)
Venceu na categoria de melhor roteiro.
Recebeu o Prêmio da Audiência.

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